Ao mesmo Deus que ensina a prazo
Ao mais esperto e ao mais otário
Que o amor na prática é sempre ao contrário
Ao mais esperto e ao mais otário
Que o amor na prática é sempre ao contrário
Ah, pra que chorar
A vida é bela e cruel, despida
Tão desprevenida e exata
Que um dia acaba
A vida é bela e cruel, despida
Tão desprevenida e exata
Que um dia acaba
(Cazuza)
Eu acordei
pensando que, 2 anos atrás, neste dia, eu estava levantando 2 horas mais cedo
que o horário normal para te preparar o café da manhã. E as duas torradas, com
margarina nos dois pães, o suco de laranja e o café solúvel com leite tinham um
ar de nobreza que beirava o poético.
A brancura
rósea da tua pele entre os lençóis, salpicada pelas várias pintas esparsas e iluminada
por um feixe de luz solar que passava por entre as persianas, te dava um ar
pueril, que era reforçado pelo teu semblante preguiçoso, refém do sono da
manhã.
Eu parei
diante de ti, 3 passos antes da cama, com a bandeja nas mãos. De todas as
memórias daquela manhã, a que (re)surge mais nítida é o teu sorriso de
satisfação, ao me ver diante de ti, segurando a bandeja, camiseta dos
rolamentos Dana e cabelo preso com uma caneta bic.
O
cheiro do café e das torradas. O meu bom dia cheio de ternura, com aquele sorrisinho
tímido bobo e o teu espreguiçar-se com um pequeno gemido, me estendendo os
braços com carinho. Eu indo insegura na tua direção segurando a bandeja e a tua
reação de pegá-la e colocá-la sobre o criado-mudo me fizeram ingenuamente
pensar que algo não estava do teu agrado. E a tua resposta “eu vou TE comer”
para o meu frustrado “tu não vai comer?” me fizeram entender que o carinho pelo
dia especial era mais complexo, mais cúmplice e mais intenso.
O
café da manhã, feito de café e torradas frios, entremeados com beijos e afagos,
após mais uma trepada ao amanhecer era muito mais do que um café da manhã na
cama, com um bom dia sem graça seguido de um “Feliz Aniversário”. No final das
contas, muito pouco acabou sendo diferente dos demais dias do ano, como na
realidade o aniversário é.
Me
dei conta de que tu realmente levava à sério este lance de lembrar (e
comemorar) aniversário e o quanto era (e é?!?) importante para ti que isso
fosse de alguma forma celebrado. Um simples cartão era causa de uma comoção
social. “Como dar um presente sem cartão?” dizia tu. Ainda que fosse um
cartãozinho de visitas, pequeno, apenas assinado com os dizeres “Parabéns” ou
“Feliz Aniversário”. Significava que, antes de mais nada, a pessoa fora
lembrada, o seu dia estava salvo.
E todos os
anos eu tomava este cuidado. Para além da lembrança, lembrar de diferentes
maneiras, mesmo que eu lembrasse sempre da mesma forma: tu dormindo, naquele
emaranhando de cobertas sob aquele raio de sol que passava pela persiana,
enquanto eu, com a cabeça meio zonza de ressaca, caminhava pé por pé para a
cozinha.
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