Eu sei que o gaúcho é uma construção histórica, política e cultural dos tempos (pós)modernos (e que do outro lado do Prata tá cheio deles também);
Que os “ideais” da Revolução Farroupilha de um governo republicano, abolicionista e com províncias autônomas tiveram outras nuances e uma série de outros interesses (políticos, econômicos, estratégicos etc) por trás;
Que os negros lutaram tanto (ou mais) que os demais “farrapos” por uma causa que em muito pouco lhes ajudou e que ninguém toca nesse assunto;
Que o hino rio-grandense só no século passado adquiriu o peso simbólico que tem hoje;
E, por fim, mas não menos importante, que NENHUMA causa justifica uma guerra.
Eu também sei que a defesa da preservação de uma “história” tão permeável, moldável e mutante no mais das vezes gera discriminação, preconceito e segregação do diferente e é tão perigosa como qualquer construção de “identidade”, “povo”, “nação” de quem quer que seja, conceitos que se formam na relação com o outro de forma etnocêntrica e violenta.
Mas isso tudo não é suficiente para que eu deixe de achar linda a visão do pampa, com o vento que assobia no ouvido e a imagem de um homem de botas e bombachas no lombo de um cavalo (mesmo que nunca tenha vivido no campo). Tampouco deixo de tomar meu mate em qualquer parte do mundo que eu esteja...
Por mais que eu racionalize sobre tudo isso, não consigo deixar de me emocionar ao ouvir o hino (embora até hoje não tenha descoberto quais são as nossas façanhas que servem de modelo à toda Terra).
O relativismo cultural é um exercício de polícia constante que exerço sobre mim. Tão violento quanto o etnocentrismo, seguramente. Mas tento me consolar pensando que talvez eu seja uma gaúcha em constante autocrítica. Hoje não temos nada para comemorar.
Que essa história inventada sirva principalmente para que pensemos sobre como nos fazemos e sobre o que podemos fazer quando nos fazemos.

Ponte da Azenha - óleo sobre tela (1929)

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